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Perdão pelo trocadalho do carilho, mas alguém anotou a placa? Com as declarações estapafúrdias sobre o Islã, proferidas durante discurso na universidade alemã aonde foi professor, o acadêmico cardeal Natzinger, também conhecido como Papa “Bento” XVI, conseguiu implodir décadas de tolerância dos muçulmanos radicais para com os católicos, transformando-os em alvos de extremistas. Uma infelicidade completa se considerarmos que se trata de um líder religioso, mas como não somos religiosos, isto pouco nos interessa. 

Um pequeno parênteses: não conseguimos a transcrição completa de seu discurso, e não nos responsabilizamos pela tradução dos trechos encontrados na FSP (http://www1.folha.uol.com.br/folha/bbc/ult272u56959.shtml). Se alguém tiver o texto na íntegra, por favor, compartilhe, pois seria interessante para analisar mais profundamente.

Daremos especial atenção para o trecho que se segue, uma verdadeira pérola de intolerância e incoerência no discurso. Eis o que hipocritamente diz o papa, ao citar uma conversa do século XIV entre um cruzado e um árabe: “O imperador[leia-se cruzado]/…/ continuou explicando em detalhe os motivos pelos quais espalhar a fé através da violência são desarrazoados. Violência é incompatível com a natureza de Deus e com a natureza da alma [grifo nosso]. “Deus”, ele disse, “não fica contente com sangue –e não agir razoavelmente é contrário à natureza de Deus. A fé nasce da alma, e não do corpo. Qualquer um que leve alguma pessoa à fé precisa da habilidade de falar bem e de raciocinar apropriadamente, sem violência ou ameaças.”“.

Pelo que consta, o deus dos católicos castiga – é aquele que julgará a todos no juízo final, e para os condenados reservam-se as piores desgraças por toda a eternidade. Mas não somos e nem pretendemos ser especialistas nesta querela litúrgica. Analisaremos somente a História.

E sendo assim, os católicos (do grego katholikós, “universal”), estes que têm a verdade universal, revelada, durante séculos mataram, pilharam, estupraram, promoveram a ignorância através da disseminação do analfabetismo (somente os padres podiam ler) e da queima de livros. Alguns afirmam que a humanidade “atrasou-se” em 50 anos aproximadamente. De fato, livros de autores como Platão e Aristóteles – e de outros que nunca conheceremos -desapareceram. O que eles pensavam da natureza de deus naquela época?

E não são estes mesmos católicos que criaram as “cruzadas”, uma série de saques contra o mundo árabe, ou a “terra santa”, época deste provável diálogo entre o “persa” e o “erudito”, citado pelo papa? Permitam-nos uma anedota: nos parece que algo de santo deve haver mesmo por lá, uma vez que há séculos os homens se matam para garantir o assentamento e a posse em um território predominantemente desértico. Isso que é especulação imobiliária!

E o genocídio dos “índios”, ou os povos que estavam estabelecidos nos continentes de ultramar, justificado pelas ordens religiosas, como a dos jesuítas? Percebam como é difícil dar uma denominação adequada à estes povos que por aqui estavam, uma vez que a maioria (ou todos) os registros sobre a colonização do continente são os dos colonizadores, em sua maioria católicos. O que dizer então da escravidão dos africanos, que sequer tinham alma, e assim podiam ser tratados com toda a crueldade sem atribuir culpa ao bom cristão? 

Nos parece que também os católicos tiveram profunda ligação com aquela bárbara série de massacres e perseguições que historicamente se conhece como “Inquisição” – que aterrorizavam a população européia durante negors e longos anos. É esta a habilidade de falar bem e raciocinar apropriadamente?

Há um filme que, na nossa humilde opinião, realiza a cena mais violenta de todo o cinema: “Sétimo Selo”, do diretor sueco Ingmar Bergman. Este filme nos faz imaginar como deve ser horrível viver numa sociedade fundamentada exclusivamente pela religião. A cena a qual nos referimos é a seguinte: a trupe circense está realizando um espetáculo em praça pública, que consegue reunir boa pate dos moradores do vilarejo. Subitamente, ouve-se um som que vai se tornando ensurdecedor. As câmeras então nos revelam uma tétrica procissão de aleijados, mutilados, loucos, beatos e padres, rodeados de cruzes e símbolos de penitência, realizando rituais de auto-flagelação, e entoando “Dies Irae”, uma missa cantada em latim, provavelmente composta no século XII, que na sua letra não faz outra coisa senão inspirar o terror e o medo entre os ouvintes (sorte nossa que o latim é uma língua morta!). Enquanto a procissão passa, podemos ver as pessoas se ajoelharem com uma expressão que mistura medo e asco. O cortejo para, o padre mor diz uma série de bravatas e figuras retóricas a respeito da finitude do homem, isto é, da morte – prevê a morte de alguns espectadores, vale-se de todo o peso ritualístico para tentar “arrebanhar” novos fiéis. Após isto, novamente aqueles farrapos humanos começam a cantar, e seguem se arrastando em seu caminho rumo à promessa de redenção.

Redenção que nunca veio. Um exemplo recente de sua razoável forma de espalhar a palavra de deus nos é dado pelo papa “Pio” XII, que abençoou o terceiro Reich. E como se não bastasse, deriva da teologia católica os atuais “evangélicos”, ou os que “trazem a boa nova”, e que atualmente no Brasil são mais conservadores do que os primeiros.

Pra finalizar,  Natzinger diz que a fé não interfere mais na razão, e que a ciência não é mais objeto de estudo ou de preocupação da religião. E quanto a posição da igreja sobre os contraceptivos, a camisinha, o aborto, a pesquisa sobre o uso de células-tronco, e tantas outras coisas, em que a igreja ainda é fortemente conservadora? Dizer que deus proibe o uso de preservativo em países como Uganda, onde grande parte da população é soropositiva, não é agir com violência?